sexta-feira, 30 de abril de 2010

PRODUTORES PROTEGEM MINAS DE ÁGUA

Na última semana de janeiro, dona Cassilda Matias Massambani, que possui 12 hectares na zona rural de Apucarana, no Norte do Paraná, foi até a cidade para receber o primeiro de 12 cheques de R$ 113 pela entrega da 'safra'. Ela não precisou plantar para obter esse produto, de grande procura e mercado garantido, um gênero de primeira necessidade, mas que, até pouco tempo atrás, não lhe trazia nenhum rendimento. Muito pelo contrário, aliás. Como ela gosta de frisar, só fazia a renda do sitiozinho dedicado à cultura de soja e milho safrinha cair diante de exigências como recompor matas ciliares e regularizar a reserva legal, que acabaram lhe tirando mais de 2 hectares de terras produtivas. Assim, o valor recebido, que em um ano garantirá uma renda extra de R$ 1.356 à sitiante, não podia ter vindo de uma atividade para ela tão inusitada: a de conservar três minas d'água que nascem em sua propriedade e que correm para um rio da região.

A produtora não foi a única a estar na fila do recebimento. Outros 63 agricultores, com propriedades nessa bacia hidrográfica, também puseram a mão em cheques com valores entre R$ 98,30 e R$ 562,80 pelo mesmo - e importante - motivo: a proteção das minas que brotam dentro de suas terras. Tal remuneração incomum, que passa a ser mensal por quatro anos, é resultado do Projeto Oásis, lançado em abril de 2009 pela Prefeitura Municipal de Apucarana com o objetivo de melhorar a quantidade e qualidade da água dos rios que cortam o município e contribuir com a qualidade de vida dos moradores da região. Os proprietários de terra estão sendo incentivados, por meio do apoio financeiro, a proteger as suas áreas com florestas e nascentes, a aumentar a cobertura vegetal de suas terras, adotar ações de saneamento ambiental e promover práticas conservacionistas de solo e recuperação de áreas degradadas.

De acordo com o coordenador técnico do projeto, Satio Kayukawa, a ideia surgiu em 2005, quando algumas autoridades municipais passaram a ficar inconformadas com as exigências da Promotoria do Meio Ambiente e do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) para que os produtores rurais do município - minifundiários, em sua grande maioria - estivessem totalmente de acordo com a legislação ambiental, ainda que às custas de perda de renda e dificuldades econômicas. 'Decidimos premiar com dinheiro aqueles que faziam tudo direitinho e que mantinham a propriedade de forma ambientalmente correta'.
A iniciativa paranaense soma-se a outras semelhantes que surgem ainda timidamente pelo Brasil. Em nível nacional, o tema já é discutido pela Agência Nacional de Águas (ANA), que no ano passado lançou o Programa Produtor de Água, e do Congresso Nacional, que analisa um projeto de lei criando a Política Nacional de Serviços Ambientais. A nova legislação prevê mecanismos de pagamento às ações conservacionistas realizadas por particulares, inclusive usando os royalties que virão do petróleo, o que poderá estimular outras cidades a seguir os exemplos não só de Apucarana, como do município mineiro de Extrema - pioneiro na questão; de Balneário Camboriú, SC; Rio Claro, RJ; e da capital paulista; que já remuneram os chamados 'cultivadores' de água.

No caso paranaense, a presença dos 'cultivadores' de água se revela realmente importante à medida que Apucarana é uma das poucas cidades no país com seu território inserido dentro de três bacias hidrográficas, sendo contemplada com milhares de nascentes. Elas são utilizadas no abastecimento de água tratada, não só dos 122 mil moradores locais, mas também do de habitantes de algumas das principais cidades do norte do Paraná, como Maringá e Londrina. 'Sabemos que, quanto maior a poluição, maior é o custo para tratar a água que vai para as cidades. Queremos água limpa com quantidade e qualidade, por isto estamos valorizando quem realmente protege os mananciais', declara João Batista Beltrame, secretário municipal de Meio Ambiente e idealizador do Projeto Oásis.

No Paraná, produtores receberão R$ 143 mil pela conservação de recursos hídricos
A principal fonte de recursos do projeto hoje tem sido o Fundo Municipal de Meio Ambiente (FMMP), formado sobretudo com os repasses mensais de 1% do que a Sanepar - a empresa estadual de saneamento básico - fatura na cidade com a prestação dos serviços de tratamento de água e esgoto, com um valor acumulado em 2009 de quase R$ 650 mil.

Conforme Kayukawa, durante 2010, o fundo permitirá o pagamento de R$ 143 mil reais a produtores já inscritos, mas será preciso buscar outras fontes de recursos para agregar ao projeto nesta primeira fase mais 486 produtores presentes na bacia do Rio Pirapó e outros 950 espalhados pelas bacias dos rios Tibagi e Ivaí até 2012. As alternativas estudadas até o momento são a obtenção de dinheiro federal instituindo-se Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), já que há muitas manchas de matas nativas na região, e a reversão para o fundo das multas ambientais aplicadas no município.

Enquanto se organiza internamente, o trabalho externo visa orientar os produtores sobre adequações necessárias nas propriedades para que possam receber o benefício. Os requisitos não são poucos, a começar pela regularização fundiária e averbação da reserva legal, passando pela existência de matas ciliares às margens dos mananciais e pela adoção de técnicas de conservação de solo, como curvas de nível, terraceamento, carreadores com caixas de contenção da água da chuva e uso de plantio direto nas lavouras de grãos.

A propriedade não pode ter pontos de lançamentos de resíduos animais, como dejetos da criação de suínos ou de aves, e deve fazer a correta destinação do lixo produzido, principalmente das embalagens de agroquímicos. Por último, deverá concordar com a fiscalização periódica e com as medições anuais da vazão das minas d'água. O atendimento ou não desses e de outros parâmetros acaba determinando os valores a serem recebidos. Globo Rural

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