O agricultor Hélio de Lima, de 58 anos, é um homem de sorte. Em sua propriedade rural na cidade de Extrema, divisa entre os Estados de Minas Gerais e São Paulo, há dez nascentes. Quando as águas encontram os riachos vizinhos, ajudam a formar o rio da foto que abre esta reportagem. O gado nunca passou sede. Não falta à família água para se banhar nos fins de semana. Além disso, há um ano, Lima passou a lucrar diretamente com suas fontes. Em troca de preservá-las, ganha da prefeitura em torno de R$ 1.300 todo mês.
A explicação é que, depois de correr cerca de 100 quilômetros, a água que brota em suas terras desemboca no sistema Cantareira, em São Paulo, que abastece as torneiras de quase 9 milhões de pessoas todos os dias. O pequeno incentivo lá na fonte ajuda os moradores das regiões norte, central, leste e oeste da capital paulista, zonas abastecidas pela Cantareira, a beber água de qualidade, com menos produtos químicos. “Deixo de criar umas 40 cabeças de gado por ano”, diz Lima. “Mas, se eu não fizer isso, o que o boi vai beber? Com o que a gente cozinha? Acabou a vida.” Ganha Lima, porque recebe compensação por não usar a terra. Ganha o planeta, com a manutenção das florestas. Ganha quem mora em São Paulo, ao desfrutar água pura e sem cheiro.
A relação monetária entre Lima e a prefeitura de Extrema tem nome: pagamento por serviços ecológicos. Ele recompensa quem ajuda a sociedade a preservar seus recursos naturais. Não é só a água doce e limpa. É também a polinização dos insetos, sem a qual não existiria agricultura. Ou a regulação do clima, feita pela floresta que estoca carbono. Ou as drogas, cujos princípios ativos vêm da fauna e da flora. “O declínio da biodiversidade leva à decadência econômica”, afirma Luiz Fernando Merico, diretor da União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN) no Brasil, um organismo que reúne 1.200 organizações preservacionistas.
Não é nenhuma novidade que a natureza é a base da economia. Sempre foi – até porque não há vida fora da natureza. Mas a abundância de recursos era tamanha que eles podiam ser considerados inesgotáveis, e portanto gratuitos. Em alguns casos, essa premissa se revelou ilusória, como na civilização da Ilha de Páscoa, no Pacífico, que ruiu quando a madeira acabou. Há um temor similar para alguns recursos de nossa civilização, como o petróleo, os peixes e até a água potável.
Revista Época
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