sábado, 6 de agosto de 2011

COMO FATURAR US$1 BI SEM CONSUMIR UMA GOTA DE PETRÓLEO

 
Os clientes nem imaginam o poder que têm. Pois foi a partir das cobranças de uma requintada clientela de arquitetos e decoradores sobre o que sua empresa andava fazendo para poupar o meio ambiente que Ray Anderson iniciou a grande transformação em sua fábrica de carpetes, a Interface .
 
A mudança começou em 1994, quando a empresa, com sede em Atlanta (EUA), comemorava 30 anos e Anderson, então, deu início a um planejamento para os 25 anos seguintes. Um dos grandes desafios é, até 2020, fazer a Interface funcionar sem consumir petróleo. “Dentro de mais 12 anos não será consumido nada que venha da natureza e não possa ser rapidamente renovável”, diz Anderson, que comanda uma empresa com 35 fábricas, está presente em 150 países e que em 2006 faturou US$ 1 bilhão.
 
Anderson participou da Conferência Internacional do Instituto Ethos, em São Paulo. Contou a uma platéia de aproximadamente 800 pessoas que na busca de transformar a Interface numa empresa que respeita o meio ambiente, já venceu etapas importantes. O tratamento dos dejetos deu início a tudo. Nada do que entra na companhia sai em forma de lixo; e as emissões também não podem causar danos à biosfera. Esses são pontos inegociáveis. Trabalhar com luz solar e energias renováveis, além de eliminar desperdícios, foram o ponto alto da primeira parte do projeto. O transporte de funcionários e produtos é parte do pacote. E qualquer medida deve ser tomada sem alimentar o efeito estufa.
 
A mudança da mentalidade e da cultura dos fornecedores fez parte de uma segunda onda do processo. Anderson lembra que deu trabalho. Mas os números compensam. A empresa conseguiu diminuir o efeito estufa em 82%; reduziu 60% o consumo de combustíveis fósseis; as matérias-primas de fontes renováveis passaram de 75% para 100%; e 27% da energia consumida hoje vem de fontes renováveis. Tais providências pouparam a natureza e fizeram bem para os cofres da empresa. “Vendemos mais de 140 milhões de m quadrados de carpete desde 2003″, declara Anderson.
 
Mas o empresário avisa que nada disso é mágica. “Levamos dois anos até formar uma massa crítica”, lembra. “Demorou mais sete anos para que pudéssemos fazer alguma divulgação de nossos resultados”. O próprio mercado financeiro, em Nova York, não acreditava na nova ordem deflagrada por Anderson e sua Interface – mas isso, segundo ele, mudou. “Hoje Wall Street tem compromisso com as energias limpas e em praticamente todas as organizações as pessoas têm muito claro que a sustentabilidade é sinônimo de vantagem competitiva”. Anderson acredita que muito em breve várias leis irão emergir dessas tentativas. “São os seguidores que fazem os líderes; e as pessoas querem nos seguir”.
 
Se fosse começar hoje o que iniciou em 1994, Ray diz que teria estudado mais biologia (“para complementar as idéias dos engenheiros”); e contrataria mais mulheres. “Elas fazem toda a diferença; elas trabalham com o lado direito do cérebro, têm uma natureza emocional e lidam com desafios diante dos quais os homens titubeiam e demonstram muita dificuldade”. Além dessas providências, Anderson diz que ficaria mais atento à igualdade social – hoje sua grande frustração. “Ainda me sinto em débito com a base da pirâmide da África”.
 
Sem a cobrança de seus clientes arquitetos e decoradores, contudo, Anderson reconhece que não teria iniciado o trabalho de transformação social e ambiental dentro da empresa. Antes da demanda do mercado, que apareceu em forma de desafio, ele confessa que nunca havia pensado sobre o tema. Anderson perguntou, então, ao gerente de produção quanto a fábrica retirava do planeta para produzir lucros. “Três semanas depois, o funcionário veio com um número tão absurdo que decidi que não poderia ficar parado; e dei o primeiro passo”.
 
A decisão pela mudança, a bem da verdade, coincidiu também com uma forte recessão no setor de carpetes – e Anderson encontrou ali uma forma de reinventar tudo.

Anderson já elegeu seu sucessor e passa o tempo livre a viajar o mundo contando sua história. Só no ano passado deu mais de 50 palestras e foi eleito pela revista “Time” como um dos heróis do meio-ambiente.

Anderson, porém, não tem todas as respostas. Sabe que quer trabalhar em qualquer lugar do planeta com as mesmas questões e soluções, embora saiba que China, Índia, Rússia e outras regiões terão de dar passos diferentes conforme o ritmo de seu desenvolvimento industrial. Quanto aos planos para 2020, o empresário trata-os como o zeloso pai das mudanças feitas na empresa. Até lá terá passado dos 85 anos – mas está certo de que viverá para ver. “Venho de uma família muito longeva.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário