Equipamentos
são colocados nas árvores mais altas,
onde é possível captar sinal das antenas
de celular
Se
uma árvore cai no meio da floresta e ninguém está perto para ouvir, ela não faz
barulho. A não ser que um smartphone especialmente modificado esteja fixado no
dossel, captando os sons ao seu redor e enviando as informações para a nuvem.
Essa é a proposta da ONG Rainforest Connection, que está usando tecnologia de
ponta para detectar a ação de madeireiros, ajudando ativistas e agentes da lei
no monitoramento remoto de grandes territórios e na proteção ambiental.
—
Nós falamos sobre carros elétricos como a contribuição tecnológica para
combater as mudanças climáticas, mas as pessoas que podem realmente ajudar a
conter o aquecimento do planeta são os guardas florestais, os ativistas e os
povos indígenas. Então, acho que nós podemos construir essas ferramentas
tecnológicas para ajudá-los lá na ponta, no campo, a proteger as florestas —
explica o fundador da ONG, Topher White.
Com
formação em Física e um bom emprego no ITER — consórcio internacional que está
construindo o primeiro reator experimental de fusão nuclear —, White decidiu
direcionar sua carreira à proteção ambiental durante uma temporada como
voluntário na ONG Kalaweit, de proteção aos gibões na Indonésia.
—
Eles gastavam um terço dos poucos recursos que tinham tentando proteger as
fronteiras do território do desmatamento ilegal — lembra o ativista high-tech.
— Isso pareceu uma maluquice para mim e imaginei que a computação poderia
oferecer uma solução.
Uma
caixa de proteção, um smartphone surrado e uma pequena placa solar. Esta foi a
solução desenvolvida para ajudar o monitoramento remoto de grandes territórios.
Um aplicativo foi criado para captar os sons e enviá-los, em tempo real pela
internet, para um servidor na nuvem. Uma aplicação desenvolvida no TensorFlow —
plataforma em código aberto do Google sobre inteligência artificial —
identifica sons específicos, como o de uma motosserra ou de caminhões, e emite um
alerta para ativistas e guardas florestais.
Equipamento é
construído com um smartphone usado, uma caixa de proteção e uma placa solar
White
explica que o sistema enfrentou duas grandes barreiras. A primeira foi a falta
de fontes de energia no meio das florestas tropicais. Então, reduzir o consumo
de eletricidade era passo fundamental para que o equipamento funcionasse de
forma intermitente. Para isso, modificou celulares Android desabilitando todas
as funções desnecessárias para o projeto, para que uma pequena placa solar
fosse capaz de alimentar o aparelho.
O
segundo desafio foi conseguir o sinal de internet, indispensável para que os
dados sejam enviados pela internet para servidores, onde a análise é realizada.
Do nível do chão, a cobertura vegetal bloqueia o sinal de telefonia móvel, mas
no dossel, no topo das árvores mais altas da mata, o serviço é captado.
—
As árvores mais altas são como torres de telefonia celular. Do alto, nós
conseguimos sinal de antenas a 15, 20 quilômetros de distância — afirma White.
O
primeiro teste foi realizado na Indonésia, com sucesso. Com os resultados em
mãos, White criou uma campanha de financiamento coletivo que levantou US$ 167
mil em 2014. No mesmo ano, um segundo projeto piloto foi iniciado em Camarões.
De lá, o projeto seguiu para a proteção de florestas tropicais no Peru, no
Equador e no Brasil.
Em
parceria com a ONG Equipe de Conservação da Amazônia, a Rainforest Connection
iniciou um programa piloto na Terra Indígena Alto Rio Guamá, onde cerca de 3
mil índios tembé vivem num território de 279 mil hectares, na divisa entre o
Pará e o Maranhão. Segundo o cacique Ednaldo Tembé, já foram instalados cerca
de 50 sensores, que cobrem cerca de 40% da área protegida.
—
A nossa terra é cheia de invasores, fazendeiros e madeireiros. A gente vem
denunciando a presença deles às autoridades há 40 anos, mas a polícia sempre chegava
atrasada, depois da destruição — conta Ednaldo. — Agora, o sistema acusa onde
estão os invasores. Ele alerta quando capta barulhos de motosserras, de
caminhões e até de tiro.
O
sistema ainda está em fase de testes, mas, segundo Ednaldo, já identificou onde
estão os focos de invasão, facilitando o trabalho dos 26 agentes ambientais da
tribo. Para White, o principal nesta etapa do projeto é que a tecnologia evite
conflitos, já que os invasores são bem organizados e podem representar uma
ameaça aos indígenas. E além da manutenção da floresta, essencial para a
sobrevivência social e cultural dos grupos indígenas, a expectativa é que o
projeto de proteção gere renda com o mercado de créditos de carbono.
—
Se você quer proteger as florestas tropicais, combater as mudanças climáticas,
o Brasil é o lugar para isso. E a boa notícia é que vocês têm muitos
territórios indígenas. O que estamos tentando fazer com os tembé é criar um
modelo, que possa ser expandido para outras tribos — aposta White.
https://oglobo.globo.com/sociedade/ciencia/meio-ambiente/smartphones-monitoram-sons-de-motosserra-para-proteger-amazonia
Nenhum comentário:
Postar um comentário