A maior floresta tropical do planeta, a Amazônica,
berço de pelo menos metade de todas as espécies vivas, pode se transformar no
próximo "Vale do Silício".
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A proposta parte de cientistas: os 6,7 milhões de
km2 de floresta –quase 19 vezes o tamanho da Alemanha–, escondem matérias-primas
que devem impulsionar a quarta revolução industrial, diz um estudo publicado
nesta semana na revista "Proceedings of the National Academy of Sciences", dos
Estados Unidos.
"As nossas análises mostraram que, se continuarmos
com os dois modelos de desenvolvimento historicamente usados, que são a
conservação pura da floresta e a atividade agropecuária, o desmatamento vai
continuar. Se não encontrarmos uma outra maneira, a floresta vai desaparecer",
afirma em entrevista o climatologista Carlos Nobre, principal autor do estudo e
recém-eleito membro da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.
Chamada de "terceira via", a proposta dos
cientistas enxerga a Amazônia como um patrimônio biológico global, que pode
impulsionar a nova revolução movida a inteligência artificial e tecnologias que
"imitam" a natureza –o biomimetismo.
"Estamos dizendo que existe um valor agregado
muito maior nos recursos biológicos da Amazônia que podem gerar uma economia
muito robusta, de longo prazo, que sustentará um novo modelo e que é compatível
com a floresta em pé", explica Nobre.
Desvendar de que plantas e animais são feitos,
como organismos se locomovem e percebem o ambiente, por exemplo, são a chave
para criação de materiais, sensores e até robôs do futuro.
"Conhecemos o caso de uma espuma resistente
produzida por um sapo que inspirou a criação de uma nova tecnologia de captura
de CO2 da atmosfera", diz Juan Carlos Castilla-Rubio, um dos autores e
presidente do conselho da Space Time Ventures, incubadora de start-ups de
tecnologia.
Em mais de 50 anos de exploração da Amazônia, que
se estende por 9 países e ocupa 47% do território brasileiro, a expansão da
agropecuária e ocupação já desmataram 20% da floresta. Segundo diversos estudos
publicados por climatologistas, se mais de 40% da floresta for destruída, a mata
densa não consegue mais se recuperar e se transforma numa savana.
A Amazônia também é fundamental no combate às
mudanças climáticas –a estimativa é que suas árvores armazenem até 200 bilhões
de toneladas de carbono. A liberação desse gás de efeito estufa na atmosfera
poderia elevar a temperatura do planeta num ritmo ainda mais acelerado.
"Talvez a proposta de explorar esse patrimônio
biológico seja, de fato, a única possibilidade de conservar a Amazônia", avalia
Nurit Bensusan, especialista em biodiversidade do Instituto Socioambiental
(ISA). "Mas é preciso muito cuidado para que haja a repartição de benefícios,
para que a exploração dos recursos naturais não vire patentes nas mãos de
empresas internacionais detentoras de tecnologia", alerta.
VALE DO SILÍCIO AMAZÔNICO
Para Castilla-Rubio, a Amazônia é o próximo centro
de inovações do mundo, mas ainda é cedo para dizer se a floresta tropical será
tomada por laboratórios de alta tecnologia.
"Ainda não sabemos como isso vai acontecer
exatamente, é um tema que vai durar 20 anos ou mais. Mas sabemos que a
capacidade e conhecimento local precisam ser reforçados, e muito", comenta
Castilla-Rubio, que compara o nível de dificuldade do projeto "à ida do homem à
Lua".
Atualmente, apenas 2% dos doutores formados
anualmente no Brasil vêm de universidade amazônicas. Ao mesmo tempo, a Amazônia
é o lar de cerca de 2,7 milhões de indígenas. Para que essas comunidades se
beneficiem do "Vale do Silício Amazônico", a pesquisadora Bensusan diz que é
preciso reverter uma tendência.
"Caminhamos para uma situação em que os
conhecimentos tradicionais estão sendo desrespeitados. É preciso fazer um
reconhecimento do importante papel que eles desempenham, não só identificando
determinados princípios, mas também usando plantas e animais para processos de
cura e cosméticos, fazendo a distribuição espacial de muitas espécies, e o
manejo", critica Bensusan.
Nobre reconhece as dificuldades. "É difícil essa
articulação do que realmente retorna para os povos da floresta quando o
conhecimento deles é apropriado e se torna um produto no mercado. Mas a Lei da
Biodiversidade está aí para ser testada", diz o cientista, fazendo referência à
legislação aprovada em 2015, que prevê pagamento às comunidades indígenas por
parte da indústria.
É por isso que a revolução impulsionada pela
Amazônia tem que ser inclusiva, defende Nobre. "E a única maneira de isso
acontecer é pela qualidade da educação. E não dá para eliminar o governo: é ele
que tem que garantir capacitação profissional e pesquisa básica. A revolução vai
acontecer, queremos que ela traga o melhor impacto e benefício para a floresta e
quem vive dela", finaliza.
21/09/2016 14h56 A área da floresta amazônica
corresponde a quase 19 vezes o tamanho da Alemanha, e não sete vezes como o
texto informava.
www1.folha.uol.com.br/.../1814669-vale-do-silicio-amazonico-pode-manter-floresta-em...
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